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SENTIR FALTA DÓI

Written by Elo | 8/12/22 3:02 PM

Você já experimentou sentir tanto a dor de algo ou alguém, que chegou a doer? Sabe, quando você sente um aperto grande, respirar parece uma missão impossível e cada membro do seu corpo sente o formigamento da falta?

Sabe, quando tudo que você vê, lembra aquilo que lhe falta, mesmo que isso não faça nenhum aparente sentido? E cada mínima coisa, cada detalhe, cada objeto ordinário do dia a dia parece ser um forte gatilho – parece estar lá só para lhe lembrar do que não mais está, talvez do que não possa ou nunca mesmo tenha estado.

Sabe aqueles dias em que a incidência do sol sobre o voo dos pássaros passando pela sua janela parece apenas uma ação da mão invisível do Universo, como um lembrete gigantesco de tudo que está perdendo ou tudo que nunca poderá alcançar.

Tem dias que a ausência dói. Que a falta dói. Que a saudade dói. Chame do que for. Ontem foi um desses dias para mim.

Eu estava vivendo a vida, como normalmente estou acostumada a fazer. E, de repente, me lembrei da falta que me faz. De tudo que eu era tão vividamente feliz em fazer e não posso mais, porque o luto engoliu coisas simples como uma ligação no final da tarde, um abraço apertado, ouvir uma risada conhecida ou ir tomar um sorvete na esquina de casa.

Imediatamente, me senti errada. Me senti vazia, me senti fora de foco, deslocada. Me senti cometendo uma injustiça – ou sendo injustiçada, quiçá? Não sei. Tudo parecia simplesmente fora do devido lugar.

Como ousa o mundo continuar a rodar, a vida continuar a acontecer, os meses continuarem a passar, as crianças continuarem a nascer e os dias continuarem a me cobrar fazer qualquer coisa que seja, se uma parte tão palpavelmente importante da minha vida não existe mais?

Aliás, como é confuso esse “deixar de ser”. Por que não seria o morrer um deixar de viver? Como alguém, simplesmente, passa a não mais existir? Não dá, né? Porque, no final das contas, ela existiu e vai sempre existir – seja nas coisas que deixou, nas pessoas que impactou ou nesses dias em que tudo me lembra dela.

E aí, nestes dias em que parece injusto estar viva, parece errado o balançar dos galhos, parece errado o percurso do destino e o existir do mundo… estes são os dias em que mais a falta dói.

E u nunca fui capaz de completamente entender o luto. Até que ele tenha acontecido comigo. Até que eu tenha sentido a pressão gigantesca que a falta de alguém a quem muito se amava faz no peito, quando você entende que não poderá nunca mais ter o que lhe era tão comum, o que lhe passava por despercebido.

Ah! Quantas coisas eu faria diferente, se soubesse… Ah! Quantas coisas teria engolido – e não dito – se soubesse… quantas coisas teria dito – e não guardado para depois – se eu apenas soubesse… quantos abraços teria arrancado de ti e quanto tempo a mais ficaria a sentir teu cheiro. Quantos mais minutos no telefone passaria ouvindo tu reclamar do dia ou contar sobre uma nova receita. Quantas notícias ou histórias repetidas não ouviria mais uma vez, se eu soubesse! Quantos pedidos negados eu teria voltado atrás, se soubesse.

Ouvir dizer que isso se chama arrependimento. Não duvido nem questiono – sim, é arrependimento mesmo. Sou culpada e confesso: me arrependo. Se apenas eu soubesse, poderia me arrepender menos, poderia sentir menos o peso que me impede de respirar, poderia sentir menos a dor que me dilacera da falta que me faz.

Embora saiba que há muito a ser trabalhado e muitas sessões de terapia serão precisas para que eu me sinta um pouco mais “normal”, para que a falta não doa tanto quanto dói agora, para que o arrependimento não me sufoque tanto quanto sinto agora… e por mais que eu saiba que um dia chegará em que isso vai assim ser… não posso dizer que hoje desejo finalizar esse texto com um cenário positivo. Não.

Sinto muito, mas, hoje, estou sentido a dor que falta faz – e estou me permitindo a sentir, mesmo, em sua totalidade e com tudo o que isso significa. Hoje não estou bem, e está tudo bem não se sentir bem de vez em quando.